Qual é o salário do dono?

Como solucionar uma dúvida crucial: que fatia do lucro o empresário deve embolsar e quanto será reinvestido no negócio

Por Wagner Roque
Ilustrações: Negreiros

PEGN – Como Fazer

Em 1988, três empresários criaram, em São Paulo, a Mica Cards, especializada em produzir cartões-postais para publicidade. Combinaram que cada um teria uma retirada de R$ 500 mensais. Em 2002, quando a empresa começou a dar lucro, o “salário” dos donos subiu para R$ 2.500 mensais – o que representava 1% do faturamento da Mica na época, de R$ 250 mil por mês. Em 2006, cada um passou a receber R$ 3.500 e, mais recentemente, quando Fernando Reis Jr. ficou sozinho à frente do negócio, o valor passou para R$ 7 mil mensais. A empresa fatura hoje R$ 4,5 milhões ao ano e, para mantê-la com fôlego, Reis Jr. reinveste, religiosamente, 70% do lucro.

Eis uma questão primordial para o sucesso do empreendimento: quanto os sócios vão embolsar – tanto de pró-labore (salário) como de proporção do resultado financeiro – e quanto vão recolocar no negócio. Para José Maria Alcazar, presidente do Sindicato das Empresas de Contabilidade e Assessoramento (Sescon), a Mica pode servir de modelo. “É preciso definir um valor de retirada para os sócios, mesmo antes de o negócio apresentar lucro. Esse valor pode aumentar à medida que a empresa dá retorno.”

Quando os donos não definem claramente os valores de retirada mensal, o fecho é quase sempre o mesmo: briga. Que o digam os proprietários da Iris Massas Rotisserie, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. O negócio foi fundado em 1994 por seis parentes: mãe, dois filhos e três noras. Os desentendimentos não demoraram a começar. Ninguém sabia quais as atribuições de cada um nem quanto poderiam embolsar mensalmente. Sem acordo, três dos donos saíram da sociedade. Os três que permaneceram foram fazer cursos de capacitação, definiram funções e quanto ganhariam. Hoje, o pró-labore é de R$ 2 mil mensais para cada um. Foi estabelecido um fundo de reserva para reinvestimento de parte do lucro – os R$ 20 mil acumulados até o momento serão destinados à ampliação da loja. “Além disso, repartimos 95% do lucro restante e distribuímos os outros 5% entre os funcionários”, diz Roger Kayasima, um dos atuais donos da Iris Massas. Com 30 empregados, a rotisseria deve faturar este ano R$ 1,5 milhão, 40% a mais do que em 2008. Parte do sucesso, segundo Kayasima, se deve à profissionalização das relações entre os sócios.

A exemplo de Kayasima e Reis Jr., você também pode ter um negócio próspero sem sacrificar a sua conta bancária pessoal.

PARA REPARTIR O BOLO
O que é preciso levar em conta para definir o quinhão que cabe a você – e o da empresa
IMPOSTOS EM DIA
As empresas em débito ou atraso com o INSS ou o FGTS não podem distribuir oficialmente pró-labore ou lucro aos sócios. As penas para quem infringe a lei vão desde multa de 50% sobre o valor creditado aos donos até um ano de detenção dos envolvidos. Por isso, antes de pensar no assunto, coloque a casa em ordem.TUDO DOCUMENTADO
Os sócios investidores, aqueles que contribuem apenas com recursos para a formação do capital da empresa, só têm direito ao lucro apurado anualmente. Mas os que entram com dinheiro e também trabalham no negócio têm direito tanto aos lucros como ao pró-labore. “Os valores e regras para as retiradas devem estar registrados no contrato social da empresa, um cuidado fundamental para evitar confusão nos casos em que o negócio tem mais de uma pessoa no comando”, diz Milton Fumio Bando, consultor do Sebrae-SP.

SALÁRIO DE MERCADO
Em caso de dúvida em relação ao valor ideal de pró-labore, os especialistas aconselham tomar como base os salários médios pagos aos profissionais que têm a mesma função que o empresário desempenha diariamente à frente do negócio. Os R$ 7 mil fixos que o dono da Mica recebe, por exemplo, têm como referência a média dos valores pagos aos diretores comerciais de empresas semelhantes à sua.

CUIDADO COM O FISCO
É preciso lembrar que sobre o pró-labore incidem INSS e Imposto de Renda, o que não acontece com o lucro, que é tributado na fonte. Então, é mais vantajoso estabelecer um pró-labore baixo e declarar a maior parte da retirada como lucro? Não é bem assim. “Se a empresa reparte altos valores de lucros regularmente entre os sócios e cada um tem oficialmente um pró-labore baixo, a Receita Federal entenderá essas transações como fraude. E isso pode resultar em multa”, afirma Alcazar, do Sescon.

ESTÍMULO ÀS VENDAS
Uma alternativa para criar um sistema móvel de retiradas é estabelecer regras de bônus atreladas às vendas. Mais uma vez, a Mica é exemplo. O programa criado na empresa vale tanto para Reis Jr., o dono, como para seu diretor executivo, que ganha um salário fixo de R$ 6.500 mensais. Quando as vendas atingem 90% da meta estabelecida, os dois recebem um prêmio de 10% do salário bruto. Essa escala vai evoluindo até um bônus de 70% do salário para 120% da meta. “Apesar da crise, já atingimos 120% das metas de vendas em fevereiro deste ano e 110% em maio”, diz Reis Jr.

INVESTIMENTOS GARANTIDOS
Com 38 funcionários, a Mica deve faturar este ano 20% acima da receita do ano passado. O lucro líquido da empresa, entre 5% e 10% sobre o faturamento no primeiro semestre, chega a 20% de agosto a dezembro, quando as encomendas de cartões-postais publicitários crescem significativamente. Independentemente dos bons resultados, no entanto, o dono da empresa segue regras rígidas na hora de embolsar a parte que lhe cabe dos lucros. Depois de apuradas todas as despesas e impostos, ele divide o lucro líquido da seguinte forma: 30% vão para a sua conta pessoal e os outros 70% são reinvestidos na empresa. “Recentemente, gastei cerca de R$ 150 mil para reformar e equipar os escritórios da Mica no Rio de Janeiro e em Brasília, sem que isso representasse peso extra nas despesas da empresa”, diz Reis Jr.

QUANTO MAIS REGRAS, MELHOR
Além de repartir o lucro em pró-labore, reinvestimento na empresa e bônus, é recomendável separar uma parte também para despesas extras com pessoal, na opinião de Roger Kayasima, sócio da Iris Massas Rotisserie. A sua empresa acaba de criar um fundo de reserva para pagar o 13º salário dos funcionários, uma prática que deve se tornar permanente daqui para a frente. “Assim, deixaremos de enfrentar um pico nas despesas nos meses de novembro e dezembro.” Em anos anteriores, segundo ele, as retiradas dos donos no final do ano chegaram a ficar comprometidas quando as vendas não aumentaram. “O procedimento está correto”, diz o consultor Bando, do Sebrae. “Quanto mais regras a empresa criar para dar transparência na divisão dos lucros, melhor.”

A RÉGUA DO LUCRO
Para uma divisão correta dos resultados do negócio, é essencial desenvolver ferramentas de medição. Reis Jr., da Mica, acompanha, online, as negociações feitas por seus 16 executivos de contas espalhados pelo país e não hesita em interferir quando percebe que a transação não resultará em bom negócio. “Além disso, eu conto com um eficiente sistema de contabilidade para saber quanto a empresa vende, quais os custos e os lucros e se eles estão aumentando, diminuindo e por quê.”

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